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Juros x bolsa: quais são os efeitos?

  • Contador SC
  • 9 de set. de 2022
  • 5 min de leitura

Esse assunto sempre volta à baila em momentos de oscilação forte dos juros. No caso brasileiro, estamos no final de um processo de aperto de política monetária que começou em março/21. Já no mundo desenvolvido, essa trajetória está apenas no começo. As bolsas caíram vigorosamente nos países ricos, arrastando os mercados por todo o mundo. Mas esse movimento é regra? Necessariamente uma alta de juros é sinônimo de queda no preço das ações? Por outro prisma, um afrouxamento monetário resulta sempre em um bull market?


No mercado, há a crença geral entre investidores e profissionais da existência inquestionável do lema “Juro sobe, bolsa cai; Juro cai, bolsa sobe”. Porém, entre o COPOM de mar/21 e a reunião de jun/22 (quinze meses), quando a taxa SELIC saltou violentamente de 2% a.a. para 13,25% a.a., (alta de 1.125 pontos-base!), o Ibovespa caiu apenas 7%, mostrando a fragilidade da relação. Já a bolsa norte-americana, no curto período de três meses entre a primeira majoração do FED fund rate em mar/22 e jun/22 (-10% para o S&P e -12% para o NASDAQ,) refletiu um banco central norte-americano inteiramente “atrás da curva”.


Olhando apenas sob a ótica do investidor brasileiro, essa ligação é intuitivamente verdadeira. Quando sobem os juros, maior a demanda por fundos DIs e renda fixa e menor interesse por ações, e vice-versa. Mas cabe lembrar que nem somente de investidores locais vive o mercado acionário. Entre mar/21 e jun/22, saíram R$ 100 bilhões da B3 de investidores institucionais + pessoas físicas + instituições financeiras + outros, ávidos pela busca de ganhos em renda fixa. Por outro lado, essa saída foi parcialmente compensada pela entrada de R$ 90 bilhões de investidores estrangeiros. Enfim, os fluxos acabam quase que se anulando e o equilíbrio de preços se dá pelo nível de retorno exigido dos players envolvidos.


Observando sob a teoria da valuation, o que importa para a formação da taxa de desconto nos fluxos de caixa descontados é o juro longo, que será influenciado pelas expectativas dos agentes, de acordo com a qualidade condução da política monetária pelo BC. De nada adianta, a autoridade baixar a SELIC “na marra”, já que o único efeito final seria uma curva de juros “empinada”. A interpretação do investidor seria que o BC, diante de uma inflação futura mais alta, teria que subir as taxas mais à frente.


De maneira inversa, mesmo com a elevação da taxa SELIC, o mercado acionário pode reagir bem, caso os investidores julguem o movimento de governo como correto, na prevenção de algum problema inflacionário futuro (resultando na inclinação negativa da curva longa, com queda de taxa nos vértices de vencimento em anos mais à frente).


Na prática, analisando dentro dos diversos períodos de aperto e relaxamento da política monetária, concluímos que não se pode comprovar estatisticamente uma correlação empírica direta entre as fases estritas de elevação/contração da taxa básica das economias com o mau/bom desempenho das bolsas. Dos vinte e trêstrechos estudados (desde a década de 70) de forte oscilação de política monetária (treze no Brasil e dez nos EUA), em apenas nove (sete no Brasil e dois nos EUA) se confirmou o senso comum – “Juro sobe, bolsa cai; juro para baixo, bolsa para cima”. Em outras nove vezes no total – ocorreu exatamente o inverso do esperado. Em cinco eventos, após grande volatilidade, a bolsa acabou praticamente a mesma pontuação, apesar da intensa variação da taxa básica.


A potencial falha do estudo realizado é não considerar a possibilidade de antecipação pelo investidor. Em outras palavras, comprar quando o juro para de subir e/ou vender quando o juro para de cair pode ser a estratégia mais correta, ao invés de esperar um novo ciclo se iniciar. Quando a alta ou queda da taxa básica efetivamente é implementada, já ocorreu a maior parte da oscilação do mercado de ações, que pode até sofrer uma “realização de lucros” no evento em si. Portanto, somente “surpresas” de política monetária tenderiam a mexer mais significativamente com as cotações no período coincidente.


Um estudo realizado por Steve Sullivan, da Meta Asset, refina mais e leva ao extremo esse primeiro fator. Ele pressupõe que o investidor irá aplicar recursos no Ibovespa exatamente no dia que se encerrou a trajetória de elevação da taxa SELIC. Ele observou vários períodos em que o investidor aplicou recursos na B3 no dia em que a taxa básica bateu seu máximo e resgatou quando o ciclo de queda terminou. Na maioria dos casos, o diferencial de retorno do Ibovespa superou largamente o CDI. O problema é que o investidor costuma esperar a primeira queda de juros do novo ciclo para entrar comprando ações, perdendo todo o ganho do fator antecipação.


Quando o BC eleva ou reduz os juros básicos pelas razões corretas, o mercado costuma aplaudir e a reação da bolsa é normalmente positiva. Por exemplo, se antevendo uma queda da atividade ou um movimento inflacionário, o BC cai/sobe o juro, vemos reações favoráveis dos investidores. Porém, se o banco central se mostra behind the curve, todo o sistema de preços do mercado (incluindo câmbio e curva de juros) fica abalado, afetando o mercado acionário. Não há dúvida que é exatamente o que estamos vivenciando em 2022. Os bancos centrais dos países desenvolvidos estão nitidamente atrás da curva e ninguém tem a menor ideia da velocidade e do ponto de chegada do processo de alta de juros em todo o mundo.


Por fim, cabe lembrar que não é somente de juros que vive a bolsa. Outras variáveis, como crescimento e propensão a risco, irão afetar a precificação das ações. Imaginem algo crível: Um país com inflação dentro das metas, juro real de equilíbrio de 3% a.a., crescimento de 3% a.a., câmbio de R$ 5/US$, contas fiscais em ordem. Um sonho possível para uma avalanche de dinheiro rumo à bolsa brasileira.


ALEXANDRE PÓVOA

É economista pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), pós-graduado em Finanças pelo IBMEC e MBA pela Stern School of Business (New York University) – com bolsa de estudos do Banco Mundial –, atua em gestão de recursos há mais de trinta anos. Ex-atleta profissional de basquetebol, trabalhou em instituições renomadas como Banco Inter-Atlântico, Fundação Eletros e Banco Morgan Stanley Dean Witter. Exerceu o cargo de Diretor de Investimentos do ABN AMRO Asset Management no Brasil, onde os fundos de investimento se notabilizaram pela excelência de gestão. Posteriormente, juntou-se ao Grupo Modal, onde foi Diretor Superintendente. Também fundou a Canepa Asset Brasil com sócios estrangeiros, gestora de sucesso na qual se dedicou como CEO. Como economista e na área de gestão de recursos, é um dos profissionais mais reconhecidos do mercado, tendo sido eleito quatro vezes, em pesquisa promovida pela Revista Investidor Institucional, o “Melhor Gestor de Fundos do Brasil”, nos segmentos de renda variável e multimercados. Póvoa dedica-se a sua empresa Valorando Consultoria, prestando assessoria a empresas e investidores, além de ministrar cursos e palestras por todo o Brasil. É colunista de diversos jornais e revistas.


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