O que é uma fraude aduaneira?
- Contador SC
- 6 de abr. de 2022
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Não há uma definição de fraude aduaneira na legislação vigente. Apesar disso, o conceito de fraude é pressuposto para a caracterização de diversas infrações e para a aplicação de penalidades aduaneiras. A principal delas é a interposição fraudulenta em operações de comércio exterior, tipificada no art. 23, V, Decreto-Lei nº 1.455/1976[1], que está sujeita à penalidade administrativa mais gravosa do direito brasileiro: o perdimento de bens.
A ausência de uma definição legal faz com que o intérprete, na maioria das vezes, recorra ao art. 72 da Lei nº 4.502/1964: “Fraude é toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, ou a excluir ou modificar suas características essenciais, de modo a reduzir o montante do imposto devido, ou a evitar ou definir o seu pagamento”[2].
Esse dispositivo, porém, não é tecnicamente preciso. Na fraude, o que se tem são atos reais – efetivamente pretendidos – com aparência de licitude, mas que violam a lei finalisticamente. Entretanto, como demonstrado por Alberto Xavier, “o impedimento ou retardamento a que o art. 72 da Lei nº 4.502/64 se refere não pode, pois, ser imputável a fato real e verdadeiro, referindo-se antes à situações em que, por simulação, a ocorrência ou o momento da ocorrência do fato gerador é ocultado sob o manto de ato enganoso”.
Contudo, não é esse o único problema da aplicação do art. 72 da Lei nº 4.502/1964 ao direito aduaneiro. A dificuldade maior está no fato de o dispositivo compreender apenas as ações ou omissões relativas ao “fato gerador da obrigação tributária”. Isso porque, nos dias de hoje, o controle aduaneiro não pode mais ser considerado uma simples manifestação setorial do poder de polícia administrativa ou da fiscalização tributária.
É certo que o aspecto fiscal do controle aduaneiro ainda é relevante. Contudo, também abrange a verificação da observância de medidas não tarifárias, no que se incluem as quotas, as proibições de importação e de exportação, o licenciamento, as exigências técnicas, sanitárias, fitossanitárias e as medidas de defesa comercial (direitos antidumping, as medidas compensatórias e de salvaguarda).
Ademais, o controle aduaneiro tem servido cada vez mais como instrumento de combate à pirataria, ao tráfico de drogas, de animais, de plantas ou de bens do patrimônio histórico-cultural, ao terrorismo e à lavagem de dinheiro. Por isso, o conceito de fraude aduaneira não deve se restringir aos aspectos tributários das operações de comércio exterior.
Fraude aduaneira X simulação
Por outro lado, não se pode confundir os conceitos de fraude e de simulação. Nesta há um negócio jurídico aparente (simulado) e outro oculto (dissimulado): as partes agem em conluio para emitir uma declaração de vontade enganosa no intuito de produzir efeitos jurídicos diversos dos ostensivamente indicados. Naquela, de modo diverso, não há qualquer ocultação: o negócio jurídico é real e querido pelas partes. Essas efetivamente pretendem o que declararam, cumprindo a lei em sua literalidade, porém, violando-a finalisticamente. Outra diferença é que, na simulação, o objetivo é enganar terceiros (animus decipiendi), ao passo que, na fraude, as partes visam a afastar a incidência de preceito legal[3].
Dessa maneira, a rigor, deve-se ter presente que, na fraude aduaneira, as partes praticam um ato ou negócio jurídico – real e efetivamente pretendido – com aparência de licitude, mas que, finalisticamente, viola um preceito legal, independentemente de qualquer implicação fiscal.
Solon Sehn
Advogado, graduado em Direito pela UFPR, mestre e doutor em Direito Tributário pela PUC/SP. Ex-Conselheiro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), representante da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Membro da Câmara de Assuntos Legislativos e Tributários da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc). Professor conferencista no curso de especialização em Direito Tributário do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (Ibet). Professor convidado das especializações em direito aduaneiro da Faculdade de Direito de Curitiba (UniCuritiba) e em direito da aduana e do comércio exterior da Univali, entre outras instituições de ensino.
Fonte: Genjuridico.com.br/
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